O general Pires Veloso, um dos
protagonistas do 25 de Novembro de 1975 que naquela década ficou conhecido como
"vice-rei do Norte", defende um novo 25 de Abril, de raiz popular,
para acabar com "a mentira e o roubo institucionalizados".
"Vejo a situação atual com muita
apreensão e muita tristeza. Porque sinto que temos uma mentira
institucionalizada no país. Não há verdade. Fale-se verdade e o país será
diferente. Isto é gravíssimo", disse, em entrevista à Lusa .
Para o general, que enquanto governador
militar do Norte foi um dos principais intervenientes no contra-golpe militar
de 25 de Novembro que pôs fim ao "Verão Quente" de 1975, "dá a
impressão de que seria preciso outro 25 de abril em todos os termos, para
corrigir e repor a verdade no sistema e na sociedade".
Pires Veloso, 85 anos, considera que não
poderão ser as forças militares a promover um novo 25 de Abril: "Não me
parece que se queiram meter nisto. Não estão com a força anímica que tinham
antigamente, aquela alma que reagia quando a pátria está em perigo".
"Para mim, o povo é que tem a força
toda. Agora é uma questão de congregação, de coordenação, e pode ser que alguém
surja" a liderar o processo.
E agora que "o povo já não aguenta
mais e não tem mais paciência, é capaz de entrar numa espiral de violência nas
ruas, que é de acautelar", alertou, esperando que caso isso aconteça não
seja com uma revolução, mas sim com "uma imposição moral que leve os
políticos a terem juízo".
Como solução para evitar que as coisas se
compliquem, Pires Veloso defendeu uma cultura de valores e de ética.
"Há uma inversão que não compreendo
desses valores e dessa ética. Não aceito a atuação de dirigentes como, por
exemplo, o Presidente da República, que já há pelo menos dois anos, como
economista, tinha obrigação de saber em que estado estava o país, as finanças e
a economia. Tinha obrigação moral e não só de dizer ao país em que estado
estavam as coisas", defendeu.
Pires Veloso lamentou a existência de
"um gangue que tomou conta do país. Tire-se o gangue, tendo-se juízo, pensando
no que pode acontecer. E ponha-se os mais ricos a contribuir para acabar a
crise. Porque neste momento não se vai aos mais poderosos".
O general deu como exemplo o salário do
administrador executivo da Eletricidade de Portugal (EDP) para sublinhar que
"este Governo deve atender a privilégios que determinadas classes
têm".
"Não compreendo como Mexia recebe 600
mil euros e há gente na miséria sem ter que dar de comer aos filhos. Bem pode
vir Eduardo Catroga dizer que é legal e que os acionistas é que querem, mas
isto não pode ser assim. Há um encobrimento de situação de favores aos mais
poderosos que é intolerável. E se o povo percebe isso reage de certeza",
disse.
Para Pires Veloso, "se as leis
permitem um caso como o Mexia, então é preciso outro 25 de abril para mudar as
leis", considerando que isto contribui para "a tal mentira
institucionalizada que não deixa que as coisas tenham a pureza que deviam
ter".
Casos como este, que envolvem salários que
"são um insulto a um povo inteiro, que tem os filhos com fome",
fazem, na opinião do militar, com que em termos sociais a situação seja hoje
pior, mesmo, do que antes do 25 de Abril: "Na altura havia um certo pudor
nos gastos e agora não: gaste-se à vontade que o dinheiro há de vir".
Quanto ao povo, "assiste passivamente
à mentira e ao roubo, por enquanto. Mas se as coisas atingirem um limite que
não tolere, é o cabo dos trabalhos e não há quem o sustenha. Porque os cidadãos
aguentam, têm paciência, mas quando é demais, cuidado com eles".
"Quando se deu o 25 de Abril de 1974,
disseram que havia de haver justiça social, mais igualdade e melhor repartição
de bens. Estamos a ver uma inversão do que o 25 de Abril exigia",
considerou Pires Veloso, para quem "o primeiro-ministro tem de arrepiar
caminho rapidamente".
Passos Coelho "tem de fazer ver que
tem de haver justiça, melhor repartição de riqueza e que os poderosos é que têm
que entrar com sacrifícios nesta crise", defendeu, apontando a necessidade
de rever rapidamente as parcerias público-privadas.
"Julgo que Passos Coelho quer a
verdade e é esforçado, mas está num sistema do qual está prisioneiro. O Governo
mexe nos mais fracos, vai buscar dinheiro onde não há. E, no entanto, na parte
rica e nos poderosos ainda não mexeu. Falta-lhes mais tempo? Não sei. Sei é que
tem de mudar as coisas, disse Pires Veloso".
Fonte: LusoPT.com IN DN
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