Recibos do CDS passados meses
depois de donativos
Nelson
Morais
16 Junho 2007 às 00:00
Cerca de
quatro mil recibos com que o CDS-PP justifica o depósito de um milhão de euros
na sua conta, em Dezembro de 2004, só foram impressos no final de Janeiro de
2005, numa tipografia dos arredores de Lisboa. Só nos meses seguintes, dois
funcionários do CDS, que estão entre os 14 arguidos no inquérito-crime
"Portucale", haveriam de preenchê-los com nomes que, na esmagadora
maioria dos casos, não permitiram à PJ identificar os alegados doadores.
Jacinto
Leite Capelo Rego é um dos supostos doadores do partido então e agora presidido
por Paulo Portas, apesar das óbvias dúvidas sobre a existência deste nome. Além
disso, a maioria dos recibos - cujas guias de transporte e facturas da
tipografia fazem perceber que foram feitos em 2005 - apresenta só dois nomes e
não tem escrito qualquer número de contribuinte, inviabilizando o apuramento da
identidade dos "mecenas".
Os referidos
funcionários terão dito à PJ que haviam preenchido os recibos com base numa
lista de nomes que lhes fora entregue e, posteriormente, destruída. Com efeito,
nem a PJ nem o Tribunal Constitucional a localizaram, apesar das buscas na sede
do CDS, além das realizadas no escritório e casa de Nobre Guedes e no Grupo
Espírito Santo (GES).
A PJ
suspeita que a verba de um milhão de euros é uma contrapartida do GES ao
despacho com que três ministros do Governo anterior - Costa Neves (PSD), Nobre
Guedes e Telmo Correia (CDS) - viabilizaram o empreendimento "Portucale",
a quatro dias das eleições legislativas de 20 de Fevereiro de 2005. O CDS alega
que a verba corresponde a donativos recolhidos em eventos realizados entre
Agosto e Dezembro de 2004.
Porém, a
data e o local desses eventos são desconhecidos pelo próprio Tribunal
Constitucional, que aludiu o assunto num acórdão recente. O tribunal pugna pelo
cuprimento da lei do financiamento dos partidos e das campanhas, que proíbe
donativos anónimos superiores ao salário mínimo. Quase todos os recibos com que
o CDS justifica a verba de um milhão - fracionada em 105 depósitos de 10 mil
euros - apresentam valores de 200 e 300 euros.
O relatório
da investigação do caso "Portucale" - espoletada pelo despacho que
declarou a "utilidade pública" de um grande empreendimento turístico
do GES, em Benavente, e autorizou o abate de 2605 sobreiros - foi remetido, a
semana passada, ao Departamento Central de Investigação e Acção Penal. O
inquérito teve como arguido Luís Nobre Guedes, além de Abel Pinheiro,
ex-director financeiro do CDS, Costa Neves, ex-ministro da Agricultura, António
Sousa Macedo, ex-director-geral de Florestas, e Luís Horta e Costa, José Manuel
Sousa e Carlos Calvário, administradores do GES.
Um despacho
"intercalar" dos procuradores Rosário Teixeira e Auristela Hermengarda
arquivou as suspeitas sobre Nobre Guedes, mas o relatório da PJ volta a
relacionar o centrista com a alegada prática de crimes de prevaricação e abuso
de poder.
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