OS “deuses” DOS ESTÁDIOS NÃO SÃO ETERNOS...NEM IMORTAIS...
Para
começar a falar do “fenómeno Eusébio” que, desde 5 de Janeiro, avivou tantas
paixões, à volta do “pantera negra”, devo esclarecer, primeiramente, quanto
gozo me deu ver este jogador, nos anos sessenta, quando começava minha missão
de sacerdote jovem.Em segundo lugar, quero afirmar que eu mesmo fui praticante
de vários desportos na minha juventude e que ainda hoje aprecio ver os artistas
do futebol na prática deste desporto, com arte e com alma, como o fazem Ronaldo
e outros, em momentos decisivos. Isto não me impede de observar que achei
exageradas muitas afirmações de vários admiradores e comentadores, que
endeusaram uma pessoa modesta, simples e humilde, que deu o seu melhor para
engrandecer o nome de Portugal, mas que não fez nada de excecional, que o
pudesse guindar ao Olimpo dos deuses e de lhe atribuir epítetos que vão desde
“imortal” até “eterno. Não podemos exagerar. Devemos ter o sentido das
proporções e saber relativizar, pois saber dar uns pontapés na bola, com arte e
com alma, não é algo de transcendente, que contribua muito para o progresso
humano e para o desenvolvimento da fraternidade e da solidariedade...
O que digo desta exaltação excessiva de
Eusébio, que eu admiro, com moderação, digo-o, igualmente, a respeito de
Ronaldo, que recebeu a condecoração de Grande Oficial da Ordem do Infante D.
Henrique. Não é que Ronaldo não seja uma figura universalmente conhecida e até
merecedora da gratidão de todos os portugueses, que o viram, ainda há poucos
dias, salvar a honra da Pátria... Mas será que a comenda cairá bem na sua
função? Quanta gente que elevou a pontos altos a nossa identidade e a nossa
cultura, quantos sábios e pensadores, quantos descobridores e cientistas,
quantos inventores das novas tecnologias ficam, até ao fim da vida, no
esquecimento dos poderes públicos, quando um simples futebolista se vê assim
exaltado, numa curta vida, por feitos apenas desportivos!
Confesso
que, apesar da minha admiração por estes dois futebolistas, as manifestações,
que, em ocasiões como a que vivemos nestes dias, me parecem desajustadas.
Bastou
que a morte de Eusébio da Silva Ferreira fosse anunciada para que esta lenda do
futebol, que passou vários anos em relativo esquecimento, estivesse agora nas
conversas de toda a gente e nos ecrãs de todas as televisões. A morte, como
tantas vezes acontece, lançou-o nos píncaros da fama. Jornais, rádios e
televisões apresentavam comentários exaustivos à pessoa e à obra deste “deus”
dos estádios e os encómios eram unânimes em todas as bocas. Também eu admirei
os seus feitos e me emocionei, nos tempos em que ele era admirado e aplaudido.
É compreensível e aceitável que o país, que se revê nos heróis da bola, se
emocione e comente. Mas, na minha opinião, quando se comenta demasiado nem
sempre se acerta. Os meios de comunicação social entraram numa espiral de
comentários, de memórias de exageros, de excessos, de infantilidades e de
juízos que roçavam o caricato, que não serviram para engrandecer a figura que
queriam homenagear.
De
repente é o unanimismo mais completo. O “rei absoluto”, num país republicano,
faz a unanimidade entre direita e esquerda, entre conservadores e progressistas!
De repente nem governo nem oposição, nem assembleia nem troica. Não se fala
mais de cortes salariais nem de diminuições nas pensões. Como que entramos na
mais completa das pazes sociais como já não víamos há muito! Perante um Eusébio,
a quem a morte ceifa aos 71 anos, calam-se as discussões e, por uma vez, o
país, une-se à volta desta figura emblemática. Como seria bom que tal
acontecesse na política e que todos nos uníssemos para salvarmos a pátria, num
governo de salvação nacional...Não seria isto muito mais útil?
Tanto
exagero, tantas expressões hiperbólicas, tantos comentários desnecessários,
onde se somavam palavras e faltavam ideias. Às tantas, saltitei entre as
diversas estações de Tv. e verifiquei que todas elas só tinham um tema a
tratar: morte de Eusébio. E, para finalizar, o sacerdote que presidiu ao
funeral no Lumiar, termina a oração fúnebre, com um viva sentido ao Benfica!
Entre
palavras desajustadas e imagens repetidas e repetitivas surgiram coisas como “o
maior português de sempre” ou “todo o mundo vai sentir a sua falta” e, a
terminar, a proposta demasiado temporã de o colocar no panteão nacional. Será
que há critérios objetivos para aqueles que lá deviam chegar por mérito próprio
e não por emotividade à flor da pele?
Compreendemos
que a morte de Eusébio tenha sido tão sentida em todo o país, a sair duma crise
tão prolongada, mesmo para além dos que gostam do desporto, pois ele
engrandeceu o país e criou amizades que vão para além da morte. Mas acho que a
melhor homenagem, nas palavras do Presidente da República, será seguir o seu
exemplo, a sua modéstia, a sua simplicidade e humildade. Os excessos cometidos
no calor da emoção serão certamente corrigidos e os nossos jogadores vão
certamente primar pela correção que ele sempre praticou e os clubes, sempre em
guerras cegas e surdas, vão igualmente lutar pela verdade do desporto e não por
exibicionismos ocos e demagogias estéreis. Eusébio, que Deus o guarde na Sua
paz.
A.MATOS
Recebi via Email de R. Balula
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