José Maria Pires foi o
subdirector-geral que aprovou a lista VIP
O inquérito à lista VIP do fisco que durante alguns meses de 2014 e 2015 permitiu saber quem consultava os dados fiscais de um grupo restrito de quatro cidadãos — Pedro Passos Coelho, Paulo Portas, Paulo Núncio e Cavaco Silva — foi arquivado em Fevereiro no Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa (DIAP) de Lisboa sem que o Ministério Público (MP) tenha inquirido todos os funcionários e dirigentes do fisco que estiveram direta ou indiretamente envolvidos na criação deste sistema de alerta. A polémica bolsa VIP foi um mecanismo configurado e testado na área da segurança informática da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) para identificar quem acedia à informação onde aparecesse o NIF dos quatro políticos. Já se sabia que o MP tinha a correr um inquérito para apurar a eventual prática de ilícitos criminais, mas não se conhecia o que estava a ser investigado em concreto. Só com o despacho fi nal de arquivamento em mãos, cujo processo e os anexos o PÚBLICO consultou, se percebe que a linha da investigação do Ministério Público se cingiu a apurar se haveria crimes relacionados com a violação da proteção de dados — de “violação de segredo, acesso ilegítimo qualificado”, de incumprimento de “obrigações relativas a proteção de dados, de acesso indevido e de violação do dever de sigilo”. Além destes, apenas foi averiguada a “eventual danificação de documento e falsidade de testemunho”. Tudo acabou arquivado por falta de prova. Um desfecho que surge quase dois anos depois de a Inspeção-geral de Finanças (IGF) ter concluído, logo em 2015, que os quatro funcionários e dirigentes envolvidos na “definição, aprovação e implementação” da lista VIP violaram deveres da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas por atos “suscetíveis de integrar diferentes ilícitos, graus de culpa e de censura”. A lista VIP, considerava a IGF, foi uma medida “arbitrária e discriminatória”, lançada “sem [ha
Além de Morujão, o MP só inquiriu mais uma pessoa (Pedro Portugal, auditor na direção de serviços de auditoria interna do fisco, mas que não surge visado pela IGF como tendo tido responsabilidades). O MP recebeu os áudios e as atas das audições parlamentares sobre o caso (entre eles, de José Maria Pires, Brigas Afonso e Paulo Núncio), bem como os autos das declarações prestadas à IGF, mas no despacho final não cita informação além do que está nas conclusões dessa auditoria. O próprio MP diz que a Comissão Nacional de Proteção de Dados (a primeira entidade a debruçar-se sobre a lista VIP) teve “dificuldade na obtenção de prova, com depoimentos incongruentes de alguns dos intervenientes, no caso José Morujão Oliveira e Graciosa Martins Delgado”. Havia matéria a esclarecer. Mas Graciosa Delgado também não foi ouvida no DIAP. Defende o MP que naquela fase (do relatório da CNPD) não foram recolhidas declarações formais. E nem Morujão nem Delgado assumiram a “qualidade formal de testemunhas”. Por isso justifi ca: “Mesmo que fossem chamados a depor na qualidade de testemunhas, não seriam, de todo o modo, obrigados a responder a questões das quais pudesse resultar a sua responsabilização penal.” Pires, que na ausência de Brigas Afonso era o seu substituto legal, foi quem autorizou o funcionamento da lista. Teve, segundo a IGF, uma “intervenção decisiva no processo”, mas também não foi inquirido. Já Brigas Afonso, embora não tenha intervindo diretamente, teve conhecimento do seu teor “através de conversas” com o seu subdiretor-geral. Algo que também não aparece referido no despacho do MP, que também não ouviu o então responsável máximo do fisco. O processo está arquivado, mas o Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos insiste que há questões por esclarecer e à Visão o presidente Paulo Ralha afirmou que teria “informações a dar” se tivesse sido ouvido. Com a investigação do MP, pouco mais se ficou a saber em relação às conclusões da comissão e da inspeção-geral.
Nem o ex-director-geral do sco, nem o número “dois” que aprovou o polémico sistema de alarme foram inquiridos. Ministério Público centrou processo em saber se houve violação da proteção de dados Fisco Pedro Crisóstomo ver] fundamentação, de facto e de direito, dos motivos e dos critérios para o tratamento específico e privilegiado” das informações fiscais de Passos, Portas, Núncio e Cavaco. Apurar se a criação desta bolsa restrita foi uma decisão discriminatória ou se era, ou não, adequada para dissuadir acessos indevidos são considerações que a procuradora adjunta responsável pelo processo considera “que extrapolam o âmbito do presente inquérito, em que se aprecia a existência de indícios de crime”. O MP concluiu não haver prova que conduzisse “à fundada suspeita da prática de um qualquer crime”. E pela mesma razão não constituiu arguidos. “Nem se vislumbra, nas circunstâncias, que outras diligências a tal pudessem conduzir.”
Depoimentos incongruentes Certo é que dos quatro trabalhadores e dirigentes em relação aos quais a IGF recomendou a instauração de procedimentos disciplinares, o Ministério Público apenas ouviu um: José Morujão Oliveira, o chefe de equipa da área de segurança informática, apontado pela inspeção de Finanças como o funcionário que teve a iniciativa de implementar a lista e selecionar os quatro NIF a monitorizar. Não foram ouvidos pelo MP nem a coordenadora dos sistemas de informação, Graciosa Martins Delgado, nem os dois dirigentes envolvidos. Ficaram por inquirir o subdiretorgeral da AT que aprovou a lista VIP, José Maria Pires, e o próprio António Brigas Afonso, então diretor-geral. Morujão, Graciosa Delgado, José Maria Pires e Brigas Afonso são os quatro visados pela IGF como tendo sido responsáveis pela implementação da lista e em relação aos quais recomenda a instauração de processos disciplinares.
228 A lista VIP existiu de 29 de Setembro de 2014 a 10 de Março de 2015 e gerou 228 alertas por acessos a dados fiscais-
O inquérito à lista VIP do fisco que durante alguns meses de 2014 e 2015 permitiu saber quem consultava os dados fiscais de um grupo restrito de quatro cidadãos — Pedro Passos Coelho, Paulo Portas, Paulo Núncio e Cavaco Silva — foi arquivado em Fevereiro no Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa (DIAP) de Lisboa sem que o Ministério Público (MP) tenha inquirido todos os funcionários e dirigentes do fisco que estiveram direta ou indiretamente envolvidos na criação deste sistema de alerta. A polémica bolsa VIP foi um mecanismo configurado e testado na área da segurança informática da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) para identificar quem acedia à informação onde aparecesse o NIF dos quatro políticos. Já se sabia que o MP tinha a correr um inquérito para apurar a eventual prática de ilícitos criminais, mas não se conhecia o que estava a ser investigado em concreto. Só com o despacho fi nal de arquivamento em mãos, cujo processo e os anexos o PÚBLICO consultou, se percebe que a linha da investigação do Ministério Público se cingiu a apurar se haveria crimes relacionados com a violação da proteção de dados — de “violação de segredo, acesso ilegítimo qualificado”, de incumprimento de “obrigações relativas a proteção de dados, de acesso indevido e de violação do dever de sigilo”. Além destes, apenas foi averiguada a “eventual danificação de documento e falsidade de testemunho”. Tudo acabou arquivado por falta de prova. Um desfecho que surge quase dois anos depois de a Inspeção-geral de Finanças (IGF) ter concluído, logo em 2015, que os quatro funcionários e dirigentes envolvidos na “definição, aprovação e implementação” da lista VIP violaram deveres da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas por atos “suscetíveis de integrar diferentes ilícitos, graus de culpa e de censura”. A lista VIP, considerava a IGF, foi uma medida “arbitrária e discriminatória”, lançada “sem [ha
Além de Morujão, o MP só inquiriu mais uma pessoa (Pedro Portugal, auditor na direção de serviços de auditoria interna do fisco, mas que não surge visado pela IGF como tendo tido responsabilidades). O MP recebeu os áudios e as atas das audições parlamentares sobre o caso (entre eles, de José Maria Pires, Brigas Afonso e Paulo Núncio), bem como os autos das declarações prestadas à IGF, mas no despacho final não cita informação além do que está nas conclusões dessa auditoria. O próprio MP diz que a Comissão Nacional de Proteção de Dados (a primeira entidade a debruçar-se sobre a lista VIP) teve “dificuldade na obtenção de prova, com depoimentos incongruentes de alguns dos intervenientes, no caso José Morujão Oliveira e Graciosa Martins Delgado”. Havia matéria a esclarecer. Mas Graciosa Delgado também não foi ouvida no DIAP. Defende o MP que naquela fase (do relatório da CNPD) não foram recolhidas declarações formais. E nem Morujão nem Delgado assumiram a “qualidade formal de testemunhas”. Por isso justifi ca: “Mesmo que fossem chamados a depor na qualidade de testemunhas, não seriam, de todo o modo, obrigados a responder a questões das quais pudesse resultar a sua responsabilização penal.” Pires, que na ausência de Brigas Afonso era o seu substituto legal, foi quem autorizou o funcionamento da lista. Teve, segundo a IGF, uma “intervenção decisiva no processo”, mas também não foi inquirido. Já Brigas Afonso, embora não tenha intervindo diretamente, teve conhecimento do seu teor “através de conversas” com o seu subdiretor-geral. Algo que também não aparece referido no despacho do MP, que também não ouviu o então responsável máximo do fisco. O processo está arquivado, mas o Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos insiste que há questões por esclarecer e à Visão o presidente Paulo Ralha afirmou que teria “informações a dar” se tivesse sido ouvido. Com a investigação do MP, pouco mais se ficou a saber em relação às conclusões da comissão e da inspeção-geral.
Nem o ex-director-geral do sco, nem o número “dois” que aprovou o polémico sistema de alarme foram inquiridos. Ministério Público centrou processo em saber se houve violação da proteção de dados Fisco Pedro Crisóstomo ver] fundamentação, de facto e de direito, dos motivos e dos critérios para o tratamento específico e privilegiado” das informações fiscais de Passos, Portas, Núncio e Cavaco. Apurar se a criação desta bolsa restrita foi uma decisão discriminatória ou se era, ou não, adequada para dissuadir acessos indevidos são considerações que a procuradora adjunta responsável pelo processo considera “que extrapolam o âmbito do presente inquérito, em que se aprecia a existência de indícios de crime”. O MP concluiu não haver prova que conduzisse “à fundada suspeita da prática de um qualquer crime”. E pela mesma razão não constituiu arguidos. “Nem se vislumbra, nas circunstâncias, que outras diligências a tal pudessem conduzir.”
Depoimentos incongruentes Certo é que dos quatro trabalhadores e dirigentes em relação aos quais a IGF recomendou a instauração de procedimentos disciplinares, o Ministério Público apenas ouviu um: José Morujão Oliveira, o chefe de equipa da área de segurança informática, apontado pela inspeção de Finanças como o funcionário que teve a iniciativa de implementar a lista e selecionar os quatro NIF a monitorizar. Não foram ouvidos pelo MP nem a coordenadora dos sistemas de informação, Graciosa Martins Delgado, nem os dois dirigentes envolvidos. Ficaram por inquirir o subdiretorgeral da AT que aprovou a lista VIP, José Maria Pires, e o próprio António Brigas Afonso, então diretor-geral. Morujão, Graciosa Delgado, José Maria Pires e Brigas Afonso são os quatro visados pela IGF como tendo sido responsáveis pela implementação da lista e em relação aos quais recomenda a instauração de processos disciplinares.
228 A lista VIP existiu de 29 de Setembro de 2014 a 10 de Março de 2015 e gerou 228 alertas por acessos a dados fiscais-
Sem comentários:
Enviar um comentário